22

então ele telefona-me a rir-se porque hoje quando viu que era dia 22, pensou 'olha, ela faz anos', e que é tão bom quando isso acontece porque as datas que traz na memória são aquelas que o fazem feliz. então telefona-me para dizer isso e que tem saudades do meu olhar, que nunca poderia esquecer a forma como eu o olhava, e eu digo-lhe que tenho vontade de me rir com ele, a olhar para ele, então ele diz-me que me admira tanto e que é muito meu amigo, e que além de ser meu amigo, que gosta muito de mim e que gosta de ser meu amigo. então eu digo-lhe que é tão bom que me diga isso e digo-lhe que ainda bem que aconteceu tudo o que aconteceu entre nós e da forma como aconteceu, e ele diz que é tão bom que eu lhe diga isso porque sempre lhe pesou a consciência por ser tão louco naquela época e por eu ser tão doida, e agora fica assim tão aliviado. depois pergunta-me se faço 49 anos e eu digo-lhe que faço 54 e ele fica tão, mas tão admirado e diz que não diz o que está a pensar, mas eu adivinho-o e também não digo, e ele diz que claro, que ele tem sessenta e nove anos, e eu digo-lhe que é verdade, pois tem. e eu fico tão feliz e além de feliz tão alegre com o telefonema, que tive que escrever aqui tudo para que não me esqueça, pois sei que já esqueci de coisas tão bonitas que ele me disse. ele é feliz, e eu fico tão feliz por isso, e fico feliz e alegre que é a melhor forma de estar feliz. depois de desligar fico a pensar naquele que há mais de sessenta e seis dias me desejou bom trabalho e não apareceu mais, e, bolas, há almas tão grandes e espontâneas e alegres e curadoras, assim como a dele e a da CC que me encheu os olhos de água e o peito de gratidão logo pela manhã.