quinta-feira, 6 de julho de 2017

o homem











estavam cerca de cinco mesas ocupadas, esta manhã, no café onde me adivinham a vontade. em todas as mesas estava alguém, com o olhar inclinado para um telemóvel, onde deslizava o dedo, suponho que à procura de ligação com um lugar que não aquele, onde se encontravam. também eu de vez em quando olhava para o meu ecrã em busca de algo que não tinha no momento. mas à minha frente, junto à janela, estava um homem luminoso. não sei se a luminosidade lhe vinha do cabelo e barba quase brancos, se da camisa, se do suave sorriso que tinha no rosto ou do brilho do olhar. sei que não tinha telemóvel pousado na mesa, nem jornal. apenas a chávena vazia do café. de vez em quando olhava à volta, reparava nos disparates que as funcionárias atiravam para a minha mesa, e fixava-se muito ligeiramente no lugar onde eu sabia estar a televisão. por vezes cruzava os pés debaixo da mesa, voltando a colocá-los a par. e esteve ali, sereno com tudo, calado, sem dedilhar, sem ler, ali, apenas. quando se levantou, vi que o televisor estava desligado. fez-me recordar o tempo em que não havia fugas de bolso, em que quando estávamos, estávamos. segui-o com o olhar até onde consegui alcançar.












6 comentários:

  1. mas que momento de observação belíssimo (não, não só o desse homem... :)

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  2. Da vontade de segui-lo e não só com o olhar...
    Estou tão farta da dependência que as pessoas têm dos telemóveis e computadores (sobretudo das redes sociais).
    ~CC~

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    1. sim, essa vontade toda e o respeito pela sua serenidade.
      é verdade, CC. quando falo aos filhos do tempo antes dos telemóveis eles ficam com pena de não os terem vivido também.
      beijo

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  3. ...belo vislumbre, assim como a Tua escrita!
    Beijoca de bom fim de semana ;)

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