segunda-feira, 17 de abril de 2017

noites em claro
























não sei porque lhes chamam noites em claro, se, na verdade são densas e escuras. nem o acordar me arranca dos sonhos, e, de olhos abertos continua a desfilar diante mim o desenrolar daquilo a que eu queria fugir. é então aqui que recorro ao telemóvel e procuro concentrar-me no que leio.


lembro-me de quando andava na catequese e assombrava-me o medo do pecado e do arrependimento. será por isso que os meus filhos não frequentaram mais do que dois ou três meses  daqueles ensinamentos que as crianças não têm capacidade para entender. mas o que me fez recordar esta noite foi o arrependimento, e o receio que eu tinha de que deus, omnipotente e omnipresente percebesse que o que eu falava não era o que sentia por dentro. nem era o medo do castigo que me atormentava, era a falta de verdade, a minha, e não cumprir com as expectativas, de deus, neste caso.

na procura de me conhecer a mim mesma [este conceito tão gasto], e alcançar algum equilíbrio [este conceito tão vago], vou descobrindo camadas que me ajudam a compreender a minha relação com os outros e a interagir com calma com tudo o que me rodeia.  tenho conseguido alguma paz, porque é fácil quando o caminho nos mostra o que consideramos progresso, evolução.

este domingo de páscoa, em que os meus desejos [reconheço agora que o desejei aos outros sem consciência de mim] foram de que fosse de renovação, compaixão, renascimento, acabo por encarar, sentir, apalpar, cheirar, o meu lado negro, primário. deitei-me com ele. percorro os princípios que tenho colados na parede da casa de banho, à procura daquele em que falhei e não encontro. atrás de mim trago um mafarrico que se ri do meu desnorteio, do meu sem-chão. 'perdoa-te a ti mesma', quero ver-te agora, 'ama o teu lado negro, aceita-te' - atira-me ele, saltitando, com o gorro pontiagudo, chocalhando os guizos como os bobos da corte.  












6 comentários:

  1. as chamadas noites em claro têm esse dom de nos mostrar de forma crua o que ignoramos ver.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. foi o cair do dia que me trouxe a resposta. a noite remoeu.
      boa segunda, conta corrente :)

      Eliminar
  2. quando imerges no negro da noite, tu podes pincelar as tuas próprias estrelas. ou antes, ser a luz. :)

    um beijo nesse teu bonito coração, ana. :)

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. quem me dera, menina bonita.
      beijo de boa noite para ti :)

      Eliminar
  3. todos temos um lado negro ana que nos ataca nas noites em claro, fazendo aquele contraste que nos atormenta, mas é também nessas alturas que podemos ver mais além e elevarmo-nos de nós, tornarmo-nos maiores. Beijinho

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. obrigada, Maria. saibamos nós vermos-nos :)
      beijinho

      Eliminar