quinta-feira, 30 de julho de 2015

arrebita































lembras-te quando me dizias que tudo na vida acontece como terramotos? de repente, aos tropelões... é verdade, p, dizias-me e eu ria-me, embora o soubesse bem, ria-me. agora de repente, esta semana, tudo acontece aos tropelões.

não, não vou falar de mim, vou falar dela, daquela mulher que vive aqui ao lado, que fica parada, com o olhar vazio esquecido nalgum lugar sem norte. contam, que a vida toda lhe fugiu das mãos e que de tanto rotinar os dias, deixou de ser notada. nem ela se reconhecia. dizem que enlouqueceu fortalecendo a razão de quem, não aceitando a sua luta pela dignidade, previa que acontecesse. foi tudo calculado meticulosamente pelo homem que ela deixou, ao longo de dez anos, para que ela tivesse aquele desfecho. eu, que demoro o meu olhar no seu, de vez em quando, percebo um brilho escondido, uma força camuflada, um animal prestes a saltar. e digo-lhe, vamos vizinha, rompa essa couraça, dispa essa pele, mostre a sua alma. mas o lodo que a prende, parece-me ser muito denso, viscoso, e os braços pesam cada vez mais, os pés gritam quando ela os mexe. 
é assim, esta vizinha, de forças perdidas, de corpo rendido, animal adormecido. só eu, que volta e meia lhe digo 'rapariga se queres ser bonita, arrebita, arrebita'.















Sem comentários:

Enviar um comentário