fomos criados à imagem de deus, dizem alguns entendidos, e embora disso eu perceba pouco, esta manhã fez-me sentido.
só isso justifica a morte do pedro. por descuido do criador. assim como eu, devia estar a passar o dedo pela lista das pessoas a eliminar, e, sem óculos, seleccionou o pedro, para a lista dos urgentes.
o pedro era uma pessoa comum, tinha 45 anos, era o único filho e vivia com os pais e para os pais, que com cerca de 80 anos, dependiam dele para tudo. então o pedro trabalhava de manhã à noite, para que nada faltasse. quando adoeceu, escondeu dos pais que estava doente, para não os preocupar. passaram apenas quatro semanas desde que se soube que o pedro não estava bem, até que morreu, na véspera do dia de consoada, no hospital, num quarto com um bom cadeirão e com casa de banho privativa, como comentava a mãe, com alívio e vaidade, sem ter noção da gravidade do estado do filho.
não era suposto o pedro morrer antes dos pais. 'é uma dor que não me vai passar, menina', diz a mãe, a cada dia mais debilitada.
agora eu, que tenho em mãos um trabalho sobre a espiritualidade na vida terrena, estou de mãos atadas e vestida de tristeza. a cada palavra que fale, tenho a sombra do pedro, de mães desoladas, de vítimas da guerra, da inocência violada.
explicarei que tudo o que acontece tem uma razão de ser, enquanto silenciosamente rezo para ser poupada, porque apenas a cada filho que se atrasa a chegar a casa, ergo um dedo e digo 'comigo não, ouviste?'.
Há dores que não se sabe como hão-de deixar de doer, nem o que fazer para doer menos a quem agora tudo dói. O tempo poderia ajudar se ao menos a quem dói assim uma dor eterna, desse pelo tempo passar.
ResponderEliminarDeus engana-se muito ou ando muito enganada...
Boa noite, Ana
nã me imagino no teu lugar, mas sei que vais conseguir, o teu coração é xxl...
ResponderEliminarbom ano
temos que aceitar, Olvido, mas não é muito difícil.
ResponderEliminarbom ano novo, Olvido :)
tu vais ajudar-me, deus das tempestades e dos mares :)
ResponderEliminarA percepção da vida, até à sua aceitação, nua e crua, é uma prova de fogo. Nem todos a querem enfrentar, dor é dor. Mas, mais tarde ou mais cedo, a sua premência vem bater-nos à porta, mesmo que encharcados em prozac. No final, o que resta? A dignidade de tentar, tentar sempre, mesmo que tenhamos a noção que a luta é inglória.
ResponderEliminarUm bom ano!
ou talvez a luta nunca seja inglória.
ResponderEliminarobrigada, AC, um bom ano para si também!