domingo, 8 de setembro de 2024

uma das maravilhas da vida

 




muitas vezes, durante as rotinas corriqueiras dos meus dias, recordo aquelas visitas no hospital, em que o estar perto me tranquilizava.

sr. dr., agora temos que ir... 

dizia eu em forma de despedida

ah... não se preocupe, vá descansada. entre nós nunca houve distância. nunca houve nem haverá...

respondeu, naquela entoação tão própria, tão delicada, tão segura.

e noutras vezes eu tentava que ele se alimentasse, que fizesse um esforço, que se fortalecesse

sabe - dizia-lhe eu - tem que fazer um esforço, fortalecer para sair daqui, ir para sua casa, retomar a vida normal

mas sabe - respondia - já não tem interesse para mim. fortalecer não vale a pena, a vida normal não me interessa

mas como não interessa? - tentava eu - cada dia é uma novidade, cada novo dia é uma nova oportunidade, tanta coisa boa pode acontecer...

tem razão - reflectindo, concordava. e naquele modo de falar pausado, emoldurando as palavras com gestos lentos - essa é uma das maravilhas da vida, mas já não me interessa... agora estou cansado...

fechando os olhos, repousava. e eu calava-me, respeitando os cansaços, a dignidade e a serenidade.

nunca haverá distância, sr. dr., ambos sabemos que não. 






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